domingo, 27 de janeiro de 2013

"But what's puzzling you is the nature of my game"

É impressionante a velocidade em que as pessoas conseguem formar uma opinião sobre alguém em quem simplesmente passaram os olhos, e a partir disso se posicionar.

Hoje você clica aqui.

Não é de hoje que peguei a terrível mania de observar as pessoas em diversos lugares. Em geral gosto de fazer isso no metro ou no ônibus, é onde as pessoas mais diferentes se esbarram e vocês consegue perceber a discrepância da imagem da população. Somos parte de uma nação formada da miscigenação, da mistura, que sempre aceita o diferente, o novo, o fora do padrão, e que com isso sempre sofreu com a discriminação do diferente, com o pré-conceito criado sobre as diferenças sociais.

Na noite de ontem, estava na estação Pinheiros esperando o meu trem, e havia uma família (Homem, mulher e 3 meninas), muito bem vestidos, com roupas sociais e não me passou desapercebido que as 3 meninas estavam vestidas como adultos em miniatura. Isso mesmo, a mais nova deveria ter no máximo 8 anos e usava um vestido e sapato de salto baixo. Pelo perfil da família percebi que se tratava de uma família evangélica voltando do culto, o detalhe veio depois.

Já dentro do trem, acabei sentada de frente para uma das meninas, que aparentava no máximo 12 anos, toda trabalhada no seu modelito social. Quando chegamos na estação Cidade Jardim uma rapaz, de aparentemente 15 anos entrou, usava jeans com um moletom amarelo fluorescente (esse que está na moda), um boné colorido e tênis, carregava uma mochila simples nas costas, e confesso o visual estava bem entre funkeiro e pagodeiro. Em determinado momento do embarque percebi que a menina de 12 anos fez uma cara feia e arregalou os olhos, direcionei meu olhar e me deparei com o menino. Ele não percebeu, ou se percebeu a reação da garota simplesmente ignorou. Já ela de um olhar de avaliação então, com a maior cara de desdém que eu já pude presenciar, ela, uma garota de 12 anos, fechou a cara e transformou o olhar arregalado do inicio em um olhar de nojo e desprezo pelo resto do trajeto.

Durante todo o percurso até a estação Santo Amaro, observei com todo o cuidado as reações da menina a cada movimento do rapaz. Em momento algum presenciei ar de encantamento ou admiração, comuns para essa faixa etária, que mistura desprezo e atração, apenas enxerguei um pré-conceito, criado sobre a imagem de pessoas que não vivenciam a mesma cultura que ela. Ao definir isso consegui perceber que esse olhar se direcionava a todas as pessoas que não estavam vestidas tal qual ela, mudando apenas de desgosto a desprezo, dependendo do nível de "excentricidade" da pessoa.

Sei que fui julgada, pois ela percebeu que eu a observava e sei que a minha camisa flanelada, minha blusa dizendo "girls rules" e meu tênis de skatista não agradaram nem um pouco o olhar daquela menina, mas me deixou angustiada saber que uma pessoa que não passa dos 12 anos é capaz de julgar e formar opinião completa sobre uma pessoa sendo que lhe botou os olhos por menos de 30 segundos. Me decepciona mais ainda saber que esse é um comportamento que lhe foi ensinado, algo com o qual ela convive todos os dias. Algo que não lhe faz bem.

É difícil encarar essa necessidade do ser humano em julgar o que vê e tomar decisões sobre a imagem que os outros refletem, o grande problema é, quando esse julgamento não se restringe apenas ao básico pessoa simples, pessoa rica, pessoa trabalhadora, pessoa alternativa e pessoa devo tomar cuidado. Sei que ainda é um julgamento, mas apenas para saber como agir no próximo passo. Sempre me disseram que devemos aparentar bem sempre, que devemos estar sempre bem vestidos e bem penteados, mas na verdade, o que eu sempre aprendi é que, antes de tudo temos que ter bom senso.

É um jogo arriscado, tentar definir o caráter pela aparência. Conheço pessoas que só andam de terno e gravata, mas não passam de pessoas do tipo devo tomar cuidado, pessoas que num primeiro momento parecem ser as mais "drogaditas" do mundo, mas são grandes caretas responsáveis e conheço muitos "drogaditos" mais responsáveis  de confiáveis que muito profissional sério.

Nossa sociedade está tomada por formadores de opinião que se vestem de pastores, líderes, mestres, professores que tentam convencer a população a seguir uma idéia de que, aquilo que não é tal qual como eles dizem está errado, que se uma pessoa se veste diferente ela não é boa, que se ela tem tatuagem é um marginal, que a menina que usa um decote é uma meretriz, e contaminam com idéias pré formuladas a cabeça de crianças que ainda estão aprendendo a tomar suas próprias decisões. Apenas com um passar de olhos é impossível dizer o que uma pessoa é, qual seu nome, sua história, sua vida, suas escolhas. É praticamente impossível descrever uma PESSOA pelo que ela apenas transmite visualmente.

São raras as ações de grupos direcionadores (e infelizmente tenho que dizer que a maioria desses grupos são religiosos) que ensinam a você a verdade, de que não importa como você se veste, mas sim o que você é como pessoa, que ensinam a respeitar essas diferenças sem preconceitos ou descriminações, que ensinam a abertura necessária para que se possa conhecer alguém além do que se vê, mesmo que ela seja visualmente atordoante.

Dizem que o Diabo está nos detalhes. Talvez seja apenas para os detalhes que esses olhares estejam sendo treinados.



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